terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Como definir hábitat?

Hábitat é uma palavra que perpassa toda Ecologia, mas, apesar da simplicidade inerente e aparente, na ciência biológica a simplicidade se perde na complexidade de classificações e medições. Diretamente, o hábitat é o lugar onde iríamos para encontrar determinada espécie. Se encontramos uma espécie na mata atlântica, quer dizer que o hábitat dela é lá? Bom, o termo mata atlântica enseja uma região geográfica enorme e, caso nossa espécie seja uma aranha, por exemplo, talvez essa região seja muito grande para ela. A distribuição da espécie tem a ver com as condições e recursos disponíveis no ecossistema. Uma espécie pode requerer maior quantidade de luminosidade, por exemplo. Dessa forma, ela será mais facilmente encontrada em áreas abertas, ou talvez em bordas de matos, ou em clareiras no meio dele. Bom, nosso papo simples já começou a complicar! Hehehe.

Quando eu comecei a bolar o meu experimento (quem não leu, veja nos posts abaixo o desenho experimental entre outros assuntos relacionados), fiquei enrolado quanto à maneira de "medir" o hábitat para uma aranha. A quantidade de hábitat é razoavelmente fácil de se determinar: se temos duas plantas iguais de um lado e apenas uma outra de outro lado, é lógico que a quantidade de hábitat disponível para que uma aranha possa utilizar é maior nas duas plantas juntas do que na outra sozinha.

Porém, como medir as diferenças de hábitat? Ou, melhor dizendo, a diversidade de hábitat? Como eu possuía quatro espécies de mudas de plantas lenhosas nativas, imaginava que teria quatro tipos de hábitat. Eu olhava para as plantas, via suas diferenças de forma (morfológicas) e pensava que elas eram diferentes. Nada mais enganador!

Aqui, entrou a parte da classificação e medição, que comentei acima.

Fui estudar morfologia vegetal! Voltei à escola. Estudei como o corpo das plantas poderia ser dividido e quais as características morfológicas que poderiam diferenciar duas espécies de plantas. Dessa pesquisa, selecionei as seguintes características:

1. Altura;
2. Número de ramos;
3. Comprimento dos ramos;
4. Comprimento dos entrenós;
5. Comprimento das folhas.

Imaginei, pela minha experiência, que essas medidas fáceis de tomar seriam representativas das estruturas vegetais com as quais uma aranha poderia se deparar e escolher para construir seu refúgio, sua teia... Além dessas medidas, adicionei a composição das folhas (simples/compostas) e a presença de espinhos.

Medi essas características em 10 mudas escolhidas ao acaso de 1000 outras mudas. Depois, fiz uma ordenação com esses dados. Bom, duas espécies que eu achava diferentes se mostraram iguais. Mas isso nem foi tão surpreendente, pois as duas são da mesma família: pitanga e jaboticaba. As outras duas espécies - tarumã e ipê - eram bem diferentes entre si e também das outras duas. Veja abaixo a ordenação:


Como meu objetivo é comparar as taxas de colonização por aranhas em manchas de vegetação com mais e menos diversidade de hábitats, naquele momento, eu teria que escolher entre uma das duas espécies semelhantes. Escolhi a pitanga e não foi aleatoriamente... Foi escolhida porque aparentemente as mudas estavam em melhores condições. A jaboticaba apresentava muitas folhas caindo e eu não queria que a estrutura da planta mudasse muito durante o experimento, pois isso poderia influenciar nos resultados.

Nesse ponto, eu tinha três espécies e resolvi que queria ter mais um tipo de hábitat. Como já havia construído várias mudas artificiais pensando em fazer outra abordagem para esse experimento, resolvi utilizar essas mudas. Refiz a análise com as mudas artificiais e:


Voilá! Tinha quatro hábitats diferentes. Para confirmar a separação gráfica fiz uma análise para determinar se realmente cada um das 10 mudas de cada planta era diferente das outras mudas e o resultado foi SIM.

Um conceito aparentemente tão simples como hábitat, teve uma longa história de estudo, classificação, medição e análise.

Mas, agora, eu tenho convicção de que os "hábitats" que eu montei para as aranhas são realmente diferentes... Será??? E se uma aranha nem estiver aí com essas diferenças? Será que, caso não haja diferenças nas taxas de colonização que estou medindo com as coletas, isso será por causa dessa diferença? Será que as aranhas não poderia estar "escolhendo" outras estruturas? Essa é a magia da ciência: You'll never know for sure!!!

Paz a todos.

2 comentários:

  1. Ronei.. Essa questão do que seria o hábitat para as aranhas e se essas variáveis determinariam isso me deixou intrigada! Fiquei pensando em se ela é glabra ou não.. se isso não poderia ser uma variável. Essas aranhas fazem teias?
    Bom, achei bem legal sua abordagem para definição de habitat e também a ideia de compartilhar suas observações do trabalho pelo blog.
    Boa sorte nos próximos passos!

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  2. Adriane,

    Todas as aranhas fazem teias... Hehehe. O tipo de uso da teia é que é diferente, dependendo do grupo. Você deve ter se referido às aranhas de teia, que fazem teias tridimensionais e orbiculares, né? Bom, eu estou coletando todas as aranhas, tanto as "de teia" quanto as cursoriais, que são aquelas que não utilizam a teia para predar. De qualquer maneira, eu escrevi essa parte no final do post para instigar os leitores...

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